quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Free...

 
Na ultima semana no bar eu e mais três amigos fomos papear, tomar um chopp e conversar sobre a vida. De uma forma inacreditável besteiras foram faladas, palavrões foram ditos e alguns preciosos ml de cerveja foram derramados. Éramos quatro, mas deveríamos ser cinco, entretanto o quinto individuo, Marcos, nosso amigo, passara no curso de Direito e ampliou (ou trocou) seu ciclo de amizades. Antes de marcamos o nosso “não fazer nada” juntos, lembramos de ligar para Marcos e chamá-lo para um chopp, todavia Marcos dispensou o convite.
Sentados então naquele bar ficamos a lembrar de tantas memórias agora arquivadas. Lembramos de quando estudávamos todos juntos e Marcos vivia a fazer o truque da pipoca (jogar duas pipocas para o alto e conseguir pegar as duas com a boca). Dos 5, apenas ele conseguia fazer isso e era o máximo. Lembramos da promessa que fizemos que assim que passássemos pro vestibular íamos em cada férias da faculdade visitar um estado e conhecer uma boate diferente. Marcos gostava de boates, mas desde que entrara no curso de Direito nos convida para as chopadas e ajunta dinheiro para o praia jurídica em Jurerê. Acontece que estou a escrever esse texto chorando, pelo simples fato de ter ido ao enterro de Marcos hoje mais cedo. A morte? Suicídio. Marcos deixou uma mensagem  no meu celular que dizia “Abra a minha terceira gaveta” e na terceira gaveta havia uma carta, um pedido de desculpas por não conseguir ser o que esperavam que ele fosse, simplesmente se sobrecarregou. Desde que se tornou um universitário Marcos deveria ter atitudes de homem e não de um rapaz, deveria beber cerveja importada, um bom whisky, ter cuidado com a fala, na verdade deveria falar pouco, falar pouco é chique. Não deveria mais beijar as meninas por aí, namorava uma garota da sua sala, não usava mais chinelo de dedo e nem deixava mais os cabelos bagunçados. Segundo os seus colegas de turma, nós éramos infantis demais, éramos bobos, talvez até dramáticos ou mal educados e definitivamente não era esse tipo de gente que ele deveria estar junto. Por alguns meses Marcos tentou nos converter, disse para abaixarmos o tom de voz, falarmos menos da vida das pessoas, para falarmos menos, nos vestirmos melhor, mas todas as tentativas dele foram frustradas. Acabou sendo ridicularizado pela gente que o apelidamos de “ Falso Burguês” ou “Sangue de caneta Bic”, apenas para mostrar que toda aquela educação sangue azul era uma farsa.  De alguma maneira Marcos ficou em cima do muro, entre os amigos e a vida que gostaria de levar, sentiu-se como um peixe fora d’agua nos dois meios. Quando engravatado, gostaria de alargar a gravata, retirar os sapatos e gritar. Quando no bar, gostaria de não ser visto. Não, essas não são minhas palavras, são as palavras do Marcos, meu amigo, que deu um tiro sem dó e piedade na própria cabeça por não conseguir corresponder as expectativas de com quem convivia. E agora aqui, na mesa do bar em que tivemos tantos momentos eu me pergunto. Até que ponto? Até que ponto vale a pena crescer? Até quanto ponto vale a pena agradar a moral e ética social? 19 de julho, 19 de julho de 1986, o dia da morte de Marcos e o dia em que declaramos “o dia oficial de não fazer nada, juntos” e vamos pro bar e rimos e conversamos. Porque disso? Porque na carta Marcos pediu para que nunca deixássemos de ser criança, que nunca deixássemos de usar roupas amarrotadas, que nunca deixássemos a nossa cerveja barata e que não perdoássemos as fofocas que chegassem aos nossos ouvidos. Obviamente teríamos conta para pagar e isso ia exigir que tivéssemos umas duas blusas sociais e um sapato, mas que não passasse disso. Pode ser que você seja do tipo conservador, que você goste de viver assim. Mas se permita um dia tomar um chopp com a gente, com chinelo de dedo, roupa amarrotada e falar da ultima transa que teve na vida. Caso não goste, pode voltar para a sua vida comum, mas por favor, não diga que somos errados, que um dia vamos mudar, ou evoluir. Por favor! Não diga que “encaretar” é sinônimo de evoluir, seja gentil com a vida que você tem, ela é única. Não faça coisas ilegais, não machuque quem te ama, mas se permita cada dia mais, ultrapasse seus limites ao invés de por limites nos outros. Talvez seja mais fácil você mudar que fazer todos do mundo mudar para ser como você. Talvez você seja um Marcos, por favor não seja o Marcos, a não ser que seja aquele que sentava conosco no bar. Até que ponto vale ser perfeito? Na verdade, até que ponto vale se fingir de perfeito?

(Megan Stuber)